O novo restaurante de Claude Troisgros, na rua Dias Ferreira, abriu as portas no dia 1º de dezembro. Queria esperar umas semanas antes de ir, deixar os motores aquecerem. Acontece que moro a poucos metros dali e, depois de ter cruzado aquele quarteirão uma meia dúzia de vezes, resistindo bravamente, resolvi entregar os pontos e entrar.
Trata-se de um misto de bistrô e boucherie. Como o nome sugere, cortes especiais de carne são as grandes estrelas, apesar de haver outras possibilidades no cardápio. A decoração explora o mote da casa com bom gosto e ludicidade. Sofás de couro vermelho e belas luminárias têm como pano de fundo paredes cobertas de desenhos dos cortes servidos ali. A enorme fotografia que traz o chef Batista, braço-direito de Troisgros, trajado de açougueiro, numa alusão à obra “Les Garçons Bouchers”, do fotógrafo Irving Penn, é uma bela sacada.
Considerando o pouquíssimo tempo de casa, o serviço fluía surpreendentemente bem, com alguns atropelos naturais nas primeiras semanas de funcionamento. O garçom que nos atendeu tinha respostas na ponta da língua pra todas as minhas perguntas sobre o cardápio – e não foram poucas.
Entre as entradas, a espuma de batatas coberta de fatias de jamón ibérico era correta apenas.
Muito melhor estava o carpaccio de melancia, coberto com maionese, alcaparras e queijo. Na aparência, um carpaccio como outro qualquer. Só que se trata, aqui, de um divertido carpaccio vegetal, onde as finas fatias da fruta (que passa por um fatiador de frios diariamente) fazem as vezes da carne. Não se trata de um conceito novo. O chef espanhol Andoni Luiz Aduriz , do Mugaritz, apresentou o famoso carpaccio vegetal há alguns anos. Na criação de Aduriz, me parece que os pedaços de melancia são assados por horas no forno e depois passam por uma churrasqueira, conferindo à fruta não apenas aparência, mas textura de carne. Na versão de Claude, a fruta é servida fresca e passaria apenas por um processo de secagem ao natural, depois de fatiada.
A fruta in natura confere frescor ao prato e os sabores dialogam, ao contrário do que eu supunha ao arriscar a primeira garfada.
Há cortes como bife de chorizo, chateaubriand, costeleta de cordeiro, bife de tira, prime rib. O cardápio anunciava ainda um tímido galeto como especialidade. Resolvi dar uma chance ao bichinho e começamos por ele. Recheado com farofa de biscoito e frutas secas, estava delicioso. Poderia estar um pouco mais úmido, mas, ainda assim, delicioso.
Mas o prime rib que chegou em seguida roubou a cena. Por trás das dimensões desafiadoras, carne macia e suculenta. Os pedaços mais próximos às camadas de gordura eram tão saborosos que me fizeram nem querer tocar o bordelaise que acompanhava o prato. O sabor não merecia intervenção.
Os acompanhamentos, servidos em esquema de rodízio, são outra boa sacada na CT Boucherie. Qualquer das carnes, inclusive o galeto, vem à mesa com uma mousse de agrião (embora saborosa, estava salgada demais), uma panelinha de batatas chips e uma gostosa porção de farofa de panko. Mas isso é apenas o começo. Garçons circulam pelas mesas servindo vagens salteadas, palmito na manteiga, tomates à provençal, couve-flor gratinada e outras coisas que agora me escapam à memória.
As sobremesas foram a nota dissonante. O creme brulê de maracujá não era ruim, mas também não era propriamente creme brulê, embora tivesse a aparência de um. E o pudim de leite com arroz selvagem pipocado me pareceu ter algo de artificial (alguma essência?) e repousava sobre uma calda muito, muito doce.
Fora o anticlímax das sobremesas (que, infelizmente, são mesmo um capítulo negligenciado em boa parte dos restaurantes), eu diria que, por todo o resto, a nova casa de Claude Troisgros merece a visita.
CT Boucherie – Rua Dias Ferreira 636 - Leblon
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